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CAPA

EDITORIAL
Editorial de Desiré Callegari: Velhos problemas, novas esperanças


ENTREVISTA
Convidado especialíssimo desta edição: o redator médico Júlio Abramczyk


ATIVIDADES DO CREMESP 1
Programe-se p/o I Congresso de Bioética de Ribeirão Preto, entre 26 e 28/10


ATIVIDADES DO CREMESP 2
Em estudo, nova sede do Cremesp para driblar a falta de espaço


GERAL 1
As mudanças no currículo da Residência Médica propostas pelo MEC


EXAME
Nova avaliação experimental do ensino médico: 1ª etapa, 15/10; 2ª etapa, 05/11


ESPECIAL
Fórum sobre Terminalidade de Vida: a conduta médica voltada p/o paciente terminal


TRABALHO
Vale a pena ser pessoa jurídica e arcar com impostos e problemas na administração do negócio?


GERAL 2
Criado fórum multiprofissional p/acompanhar ações da Agência Nacional de Saúde


HISTÓRIA
Os 50 anos de história do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto


AGENDA
Destaques: a vista do superintendente do Iamspe e a Semana Acadêmica em Pouso Alegre (MG)


TOME NOTA
Alerta Ético: o que fazer quando o paciente omite ou mente?


NOTAS
Destaque p/o debate sobre a reforma do modelo de assistência em Saúde Mental


GALERIA DE FOTOS



Edição 228 - 08/2006

ENTREVISTA

Convidado especialíssimo desta edição: o redator médico Júlio Abramczyk



No coração da imprensa



O redator médico, cardiologista e especialista em jornalismo científico revela um pouco de sua trajetória profissional, fala sobre saúde e mídia e mostra que muita coisa melhorou na saúde brasileira

Paulistano, formado pela Escola Paulista de Medicina, em 1966, Júlio Abramczyk é unanimidade entre seus colegas – médicos e jornalistas – pela simpatia, dedicação ao trabalho e ética profissional. De sua máquina de escrever, depois do computador, ele acompanhou mudanças fundamentais na Medicina e transpôs essa informação científica para a linguagem leiga, em milhares de artigos e reportagens em jornais e revistas brasileiras e internacionais, em especial na Folha de S. Paulo. Abramczyk também coordena o serviço de Cardiologia do Hospital Santa Catarina, em São Paulo, onde começou há 40 anos.

Depois de 40 anos entre plantões e redações de jornais, o senhor se considera mais médico ou mais jornalista?
Esse é o problema da minha vida. O pessoal da medicina acha que só faço jornalismo e os jornalistas pensam que só faço medicina. Então, para que não haja dúvida, tome aqui meu cartão de médico e este outro aqui, de jornalista (risos).

Como foi seu início na Medicina?
Comecei o internato em 1966, no Hospital São Paulo, da Escola Paulista de Medicina, hoje Unifesp. Logo em seguida vim aqui para o Hospital Santa Catarina para cuidar de uma Enfermaria de Indigentes e trabalhei quinze anos nessa atividade. Nesse tempo, também dava aulas na escola de enfermagem aqui no Santa Catarina, uma escola de muito bom nível. Depois fui para o Instituto Dante Pazzanezze, fiquei um ano lá como estagiário, onde aprendi muito sobre Cardiologia. O instituto – comparado ao que é hoje – era um cubículo. O Adib Jatene chegava lá com um (carro) DKW caindo aos pedaços e trabalhava no laboratório experimental. Foi dali que nasceu a cirurgia cardíaca no Brasil.

Ao longo desses anos, o que mudou na atividade do médico?
Acho que o principal é a relação médico-paciente. Na escola, aprendi com meu grande mestre, Jairo Ramos, uma figura fantástica da clínica médica, que primeiro é preciso examinar o paciente e, somente depois, pedir os exames. A mudança brutal é que hoje o pessoal antes pede os exames e depois pensa em como fazer o diagnóstico. Não são todos, mas há uma parcela importante que trabalha assim. É verdade que muitos médicos pedem os exames para se proteger de eventuais ações judiciais, porque também muitos pacientes já não confiam no médico. A relação médico-paciente está se esgarçando. Quando me formei, a postura do paciente era mais respeitosa. Hoje as pessoas procuram o consultório mais próximo de suas casas e, caso não fiquem satisfeitos, rasgam a receita e buscam outro profissional.

E como foi a iniciação ao jornalismo?
É anterior à Medicina. Eu sou filiado ao sindicato dos jornalistas há 46 anos. Quando era estudante, fui trabalhar como revisor de texto no jornal O Tempo. Três meses depois, passei para a redação, que era uma verdadeira escola de jornalismo, chefiada pelo Hermínio Sachetta, um jornalista fantástico, que foi meu grande mestre. Eu entrava na redação e ele gritava: “seu cachorrão, quantas matérias você trouxe? Só três? Depois, chegava e dizia: 'Vem cá, meu filho. Você tem que fazer assim, escrever esta frase de outra maneira...”. Eram praticamente aulas particulares de jornalismo. Passei por várias editorias, ficava um mês em cada setor, exceto polícia e esporte, temas que realmente não me interessam. A redação era repleta de militantes políticos, a maioria era ligada ao Partido Comunista, mas o Sachetta era trotsquista. E, apesar das diferenças políticas, todos se respeitavam profissionalmente.

Mas, quando surgiu o redator médico Júlio Abramczyk?
Durante algum tempo parei de trabalhar em jornais para me dedicar ao vestibular de medicina. Quando entrei na Escola Paulista, voltei a buscar empregos para ganhar um “tutuzinho”. Quando estava no final do primeiro ano encontrei um antigo editor, o Hugo Penteado Mendonça, e ele me disse que a Folha de S. Paulo estava buscando um redator médico já havia seis meses. O antigo redator, Pedro Kassab – pai do atual prefeito de São Paulo –, havia saído do jornal para fundar a revista Médico Moderno; mais tarde, ele entrou na política médica e foi um desastre. Até então a Folha só aceitara médicos formados para o cargo de redator e, quando eu me apresentei para a vaga, o editor fez pouco caso, resistiu, mas felizmente recebi o apoio de vários colegas jornalistas e fui aceito para um teste, no final de 1959. Em janeiro de 1960, fui contratado pela Folha e, em 1961, ganhei o Prêmio Governador do Estado de jornalismo, junto com o professor José Reis, que foi o pioneiro no Brasil em jornalismo de divulgação científica.

Falando no assunto, qual é a maior dificuldade de seu trabalho na mídia? Como o senhor consegue passar os conceitos da Medicina sem utilizar o jargão técnico?
Isso é o mais fácil. A parte mais difícil é separar o joio do trigo, é checar a informação sobre um “tratamento mágico”, um medicamento novo, uma descoberta promissora, por exemplo, para o tratamento de câncer. O que tem de gente que arruma assessor de imprensa para usar nossa credibilidade profissional apenas para sua autopromoção... No início da carreira, eu era muito inseguro, mas ao longo do tempo passei a considerar as publicações científicas sobre cada assunto. Se alguém chega com uma conversa sobre um novo tratamento, ele precisa provar que já conseguiu publicar algum artigo sobre o assunto numa revista científica reconhecida internacionalmente. Nas revistas sérias, antes dos trabalhos serem publicados, eles passam por uma avaliação e revisão de pares científicos. Existem revistas de divulgação para médicos que na verdade são publicações promocionais de medicamentos, ou de próteses, ou de aparelhos.

Como é a sua relação com os fabricantes desses produtos?
Os médicos, assim como os jornalistas, são assediados; recebem ofertas de viagens, presentinhos, coisas do gênero. Mesmo na Folha eu já recebi várias pressões dos editores para viajar a convite de laboratórios, mas eu sempre recusei. Uma vez o editor insistiu, era um congresso sobre cardiologia, e eu acabei indo, e na volta, não escrevi uma linha sobre o tal congresso. As empresas oferecem esses brindes para estabelecer relacionamento com os profissionais. Mas, já escrevi sobre isso, não existe almoço de graça. Se alguém te paga um almoço, ele está fazendo um investimento e vai querer algo em troca.

Em seus 40 anos na área médica e 46 de jornalismo alguma coisa deve ter melhorado. A saúde avançou nesse tempo todo?
Melhorou muito. Por exemplo, faz muito tempo que eu não escrevo nada sobre desidratação infantil. O verão passa e não se escreve uma linha sobre o assunto, que antes ocupava páginas inteiras do jornal. As mães aprenderam a tratar de seus filhos e os governos aprenderam a tratar melhor das condições sanitárias. Claro que ainda há bolsões de pobreza, por exemplo, nas áreas de invasões, localizadas às margens dos mananciais de água potável. Lembro também da implantação da vacina Sabin no Brasil. Até então, aplicava-se a vacina injetável, a Salk. O governo programou uma campanha experimental de vacinação no ABC e, como se tratava de um vírus vivo, surgiu uma boataria sobre os efeitos que a vacina poderia causar ao organismo, até mesmo provocar a doença. Na verdade, depois eu soube que havia uma pressão do laboratório que fabricava a Salk para evitar a entrada da concorrente. Uma tarde eu estava na redação, quando chegou um telegrama de uma agência noticiosa com a informação de que a União Soviética aplicara a vacina Sabin em 400 mil crianças, com bons resultados. Daí, se – em plena guerra fria - os soviéticos estavam usando uma vacina americana em suas crianças, é porque ela devia ser muito boa. E com essa informação rápida, eu escrevi uma matéria que ajudou a derrubar as resistências contra a Sabin. E, graças à nova vacina, a poliomielite desapareceu do Brasil. Acho que uma parte importante dessas melhorias se deve aos novos profissionais que saíram da Faculdade de Saúde Pública da USP. Posso dizer que o pessoal da saúde pública tem grande “culpa” na melhoria das condições de saúde da população. Esses profissionais competentes deveriam ganhar o triplo do que ganham, pois eles ajudam o estado a economizar recursos.

Falando em salário, como vão as condições de trabalho dos médicos?
Há um tempo atrás, a definição de médico era a de alguém que tinha um fusca, um relógio Seiko e três empregos. Agora, o médico para sobreviver tem que ter cinco empregos. Nesses 40 anos, desapareceu o “medalhão” da medicina, como havia antes. Por outro lado, foi criada a residência médica, que acabou com aquela história de trabalhar de graça durante dez anos para poder olhar pacientes. A residência médica de dois anos oferece ao jovem médico uma experiência incomparavelmente melhor. Antigamente um médico só era considerado bom depois de 10 anos de formado e hoje ele está “pronto” depois de dois ou três anos. O problema é que o residente ganha 1.200 ou 1.400 reais por mês e, como parte deles já tem família, eles precisam ter quatro empregos, além da residência. Ora, a residência toma o período integral, inclusive com plantões; então o médico acaba se dividindo, dorme mal e isso prejudica o atendimento.

E na sua área, a Cardiologia?
Acho que as coisas só melhoraram. Quando comecei na profissão, não existia a cirurgia cardíaca. E pude acompanhar a evolução realizada pelo pessoal do Dante Pazzanezze. Até ganhei um Prêmio Esso em 1970 com uma matéria sobre a cirurgia de ponte de safena na fase aguda do enfarte. Era o Zerbini e sua equipe. Eu fiz a matéria quando eles apresentaram o trabalho em um congresso de cardiologia. Veja o cuidado; só publiquei a inovação depois que a pesquisa passou por um comitê científico. Hoje a cirurgia cardíaca é mais segura do que a da apendicite. Acho que de forma geral a técnica cirúrgica melhorou muito.

Na imprensa, as coisas também mudaram?
Olha, para aquela reportagem sobre a ponte de safena eu tive duas páginas inteiras, sem nenhuma publicidade. Hoje, com as sucessivas reformas gráficas dos jornais, isso é quase impossível. Esse enxugamento dos jornais começou no tempo da morte do Tancredo Neves, quando tinha que explicar o que estava acontecendo em textinhos curtos. Eu achava que não ia conseguir, mas fiz e as matérias tiveram grande repercussão. Mas não tenho certeza se isso prejudica a informação. Recentemente escrevi um trabalho para um congresso internacional sobre divulgação científica. O tema era justamente short stories e os organizadores e participantes gostaram muito. Hoje as pessoas não têm mais paciência para ler. Quais são as seções mais lidas no jornal? São os drops, as colunas curtas. Talvez, no futuro, a divulgação científica seja feita em quadrinhos.

Com o crescimento da tevê, o senhor acha que o jornal ainda é – de fato – um formador de opinião?
O jornal tem maior credibilidade do que os outros meios. Mas ele tanto pode formar, desinformar ou deformar a opinião pública. Agora, nesta época de eleições, nós vemos os jornais se transformarem em veículos da desinformação. Ainda será necessário muito tempo para que a população, de forma geral, possa ganhar a capacidade de discernir a informação correta da simples propaganda. E isso depende de educação, memória, tradição cultural e organização política, que só se faz com o tempo.

De qual trabalho o senhor gosta mais? Do jornalismo ou do consultório?
Olhe, eu não trabalho por prazer, mas tenho grande prazer no meu trabalho. As duas atividades me agradam muito. Sinto grande satisfação em praticar a medicina, mas a minha psicoterapia é o jornalismo.



Três tempos: Júlio na redação da Folha de S. Paulo, nos anos 60, nos anos 80 e por volta de 2000  


Obs.: na home, destaque da charge de Paulo Caruso, do arquivo pessoal do entrevistado


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