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CAPA

EDITORIAL
Editorial de Desiré Callegari: Velhos problemas, novas esperanças


ENTREVISTA
Convidado especialíssimo desta edição: o redator médico Júlio Abramczyk


ATIVIDADES DO CREMESP 1
Programe-se p/o I Congresso de Bioética de Ribeirão Preto, entre 26 e 28/10


ATIVIDADES DO CREMESP 2
Em estudo, nova sede do Cremesp para driblar a falta de espaço


GERAL 1
As mudanças no currículo da Residência Médica propostas pelo MEC


EXAME
Nova avaliação experimental do ensino médico: 1ª etapa, 15/10; 2ª etapa, 05/11


ESPECIAL
Fórum sobre Terminalidade de Vida: a conduta médica voltada p/o paciente terminal


TRABALHO
Vale a pena ser pessoa jurídica e arcar com impostos e problemas na administração do negócio?


GERAL 2
Criado fórum multiprofissional p/acompanhar ações da Agência Nacional de Saúde


HISTÓRIA
Os 50 anos de história do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto


AGENDA
Destaques: a vista do superintendente do Iamspe e a Semana Acadêmica em Pouso Alegre (MG)


TOME NOTA
Alerta Ético: o que fazer quando o paciente omite ou mente?


NOTAS
Destaque p/o debate sobre a reforma do modelo de assistência em Saúde Mental


GALERIA DE FOTOS



Edição 228 - 08/2006

ESPECIAL

Fórum sobre Terminalidade de Vida: a conduta médica voltada p/o paciente terminal


Fórum amplia o debate sobre terminalidade da vida


José Eduardo de Siqueira, Clóvis Constantino e Desiré Callegari, na abertura do encontro

Cremesp e CFM reúnem médicos, juristas, promotores e religiosos para discutir a utilização de suportes avançados

Por meio do fórum Desafios Éticos na Terminalidade da Vida, o Cremesp e o Conselho Federal de Medicina (CFM) deram um importante passo rumo à produção de Resolução referente a um dos grandes dilemas enfrentados pelos médicos em seu dia-a-dia: é moralmente aceitável  imputar sofrimento inútil e desproporcional a pacientes sem chances de recuperação? 

Durante os dias 27 e 28 de julho palestrantes, debatedores e platéia tornaram mais claras as especificidades e ampliaram o diálogo sobre este tema, que já foi objeto de consulta pública no Cremesp, em maio de 2005.

Uma das propostas apresentadas no fórum foi a de divulgar a minuta de Resolução do CFM, cujo objetivo é orientar os médicos sobre condutas voltadas ao doente em fase terminal, de enfermidade grave e incurável – respeitando estritamente a vontade do paciente ou de seu representante legal.


Tecnologia e sofrimento 

Logo no início do fórum, o conselheiro corregedor do CFM, Roberto D’Ávila, lembrou o enorme salto evolutivo representado na percepção da morte pelo homem. “O ato de enterrar seus mortos diferenciou o humano de seus ancestrais”, enfatizou.

Segundo D’Ávila, a preocupação sobre “o morrer” sempre foi constante. Esse fato, aliado à incorporação tecnológica e à falta de preparo dos estudantes de medicina sobre o tema, “torna cada vez mais angustiante a tarefa de colegas que trabalham nas emergências e terapias intensivas, que ainda não se sentem seguros em lidar com a morte”.

José Eduardo de Siqueira, presidente da Sociedade Brasileira de Bioética, concordou: este contingente está carente de direcionamento. “Vivemos a angústia de presenciar o sofrimento de pessoas em seu final de vida, porque fizemos crescer, de maneira exagerada, a tecnologia, e diminuímos desproporcionalmente a reflexão (...). Refletir não significa desprezar a tecnologia e, sim, colocá-la em seu devido lugar”.

Luta encampada


Na abertura do fórum, o presidente do Cremesp, Desiré Carlos Callegari, destacou os esforços conjuntos do Centro de Bioética e da Câmara Técnica Interdisciplinar do Cremesp (coordenada pelo conselheiro Reinaldo Ayer de Oliveira, organizador do evento - foto ao lado) que, durante dois anos, criaram o esboço da Resolução que serviu para subsidiar a proposta do CFM. 

“No final (do encontro) esperamos contar com os argumentos necessários para afirmar serem éticas, sim, a limitação e a suspensão de tratamentos que levam ao prolongamento do sofrimento de doentes em fase final de enfermidade grave e incurável”, disse Desiré.

Reforçou tal raciocínio Gabriel Oselka, coordenador do Centro de Bioética do Cremesp. Durante a mesa redonda A Terminalidade da Vida em Doenças Agudas encerrou sua apresentação, comentando: “há tempos muita gente vem insistindo que os Conselhos de Medicina e particularmente o CFM, deveriam editar uma Resolução chamando claramente a atenção para o fato de que, em muitas situações, limitar tratamento é do melhor interesse dos pacientes, familiares, médicos e sociedade”.

Seu colega de mesa, Renato Terzi (Associação de Medicina Intensiva Brasileira – AMIB-SP) completou: “estamos promovendo a distanásia (morte lenta, ansiosa e com muito sofrimento) sem nenhum motivo, ou por motivos inconfessáveis (...). Já é o momento de parar de falar e começar a fazer”. A profundidade das discussões “é tamanha que o CFM resolveu abraçar esta causa, com a finalidade de levar médicos, imprensa e opinião pública a uma nova fase de discussão”, opinou Clóvis Constantino, conselheiro do Cremesp e do CFM e membro da Câmara Técnica sobre Terminalidade da Vida. “Todos nós sabemos que há muitos preconceitos relacionados ao tema”, destacou.

Morte digna, em vez de distanásia

A palestra Desafios Éticos sobre Terminalidade da Vida foi proferida pelo padre e bioeticista Léo Pessini, vice-reitor do Centro Universitário São Camilo. Com base no cristianismo, o Padre Léo defendeu a morte digna em detrimento da distanásia.“É tão injusto prolongar a vida de maneira inútil quanto encurtá-la”, ponderou.

Para os que crêem que a Igreja Católica prega qualquer esforço para a manutenção das funções vitais do homem, Pessini informou: de acordo com o cristianismo, a “vida humana, na sua dimensão física, é um bem fundamental, mas não um bem absoluto em si”.

Sugeriu, ainda, o abandono da busca obstinada pela cura e a valorização do cuidado. Lembrando frase da britânica Cicely Saunders, impulsionadora do conceito de hospices, finalizou: “o sofrimento de uma pessoa somente é intolerável quando não há ninguém para cuidar dela”.

Preocupações legais

Além dos questionamentos de origem ética, no decorrer do fórum ficou clara a segunda preocupação mais freqüente entre aqueles que lidam com situações em que o prolongamento da vida parece “ser algo que contraria o melhor interesse do paciente”: existem chances de punição legal aos médicos que decidirem limitar tratamentos?

Apesar de haver uma brecha legal sobre o assunto, a própria minuta de Resolução destaca trechos da Constituição Federal, capazes de orientar as tomadas de decisão: o art. 1º, inc. III, por exemplo, elege o princípio da dignidade humana como um dos fundamentos da República; e o art. 5º, inc. III estabelece: “ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante”.

Entre os advogados presentes, houve consenso de que, neste assunto, os representantes do Direito, como a população em geral, esperam respostas dos médicos. O ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Gilson Langaro Dipp, opinou que as questões devem ser enfrentadas com o respaldo das entidades médicas, dando ênfase à dignidade do paciente. Mas enfatizou: “tratam-se de conceitos puramente médicos e se os senhores não estão preparados, não chegam a um consenso, imaginem nós”.

Esboçaram semelhante ponto de vista o chefe do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, Leonardo Bandarra; e o promotor de defesa dos usuários de Serviços de Saúde (Pró-Vida), Diaulas Ribeiro, que, em sua palestra, enfatizou: o direito de morrer não é antagônico ao de viver. “Como a vida, a morte é um direito do ser humano”, explicou.

Representante do Ministério Público, Diaulas salientou que, nessa esfera, não houve qualquer restrição à lei Estadual nº 10.241/99, conhecida como “Lei Covas”. Entre outros pontos, a Lei Covas permite ao doente escolher seu local de morte e recusar procedimentos e tratamentos de prolongamento de vida.

Maria Mathilde Marchi, coordenadora do Núcleo Especializado em Direito (Nudi), do Hospital das Clínicas (HC/FMUSP), registrou que, como jurista, por diversas vezes se defrontou com juízes, em relação à manutenção de equipamentos em UTI a pessoas em estado vegetativo persistente. Para contornar tal dificuldade, falou que o HC criou termo de consentimento esclarecido, “no qual tentamos reconhecer a autonomia do cidadão”.

A pediatra e advogada Maria Elisa Villas-Bôas – que, em sua palestra Estado Vegetativo Persistente manteve postura cautelosa a respeito de limitação/interrupção de tratamento – ponderou, em resposta à platéia sobre pacientes não terminais que recusam tratamento: “me parece que, para a legislação brasileira, existe vida, mas não o dever de sobrevida artificial”.

Embrião

Em maio do ano passado, o Centro de Bioética do Cremesp e a Câmara Técnica Interdisciplinar de Bioética do Cremesp, abriram nos sites do Conselho (Bioética e Cremesp) consulta pública sobre “Terminalidade da Vida”, obtendo grande sucesso. O texto serviu como uma espécie de embrião da resolução ora sugerida pelo Conselho Federal de Medicina.

Durante um mês a consulta ficou disponível nos sites. Entre os que opinaram, 118 demonstraram-se favoráveis ao texto e/ou a idéia proposta pela minuta; 13, contrários; e nove não deixaram clara sua posição.

Quanto às opiniões em contrário, a maioria expôs motivos religiosos. Entre as favoráveis, destacaram-se razões como solidariedade ao doente e a necessidade de normatização ética e legal sobre o assunto.

Programação

Coube ao conselheiro corregedor do CFM, Roberto D’Ávila (também coordenador da Câmara Técnica sobre Terminalidade da Vida da entidade), compor a mesa de abertura do evento, da qual fizeram parte o presidente do Cremesp, Desiré Carlos Callegari; o conselheiro do Cremesp e do CFM, Clóvis Francisco Constantino; e o presidente da Sociedade Brasileira de Bioética, José Eduardo de Siqueira.

O padre Léo Pessini, vice-reitor da Universidade São Camilo – que há 25 anos se dedica ao tema “ética no final da vida” – realizou a palestra de abertura do evento (veja box). Em seguida, foi promovida a mesa-redonda Morte Encefálica – Estado Vegetativo Persistente – Síndrome do Cativeiro, moderada por Gerson Zafalon Martins, conselheiro do CFM e coordenada por Solimar Pinheiro da Silva, presidente do Conselho Regional de Medicina de Tocantins.

Participaram Luiz Alcides Manreza, neurocirurgião da FMUSP; Maria Elisa Villas Bôas, pediatra e advogada. Como debatedores, Marco Segre, professor de Bioética da Unisa e professor emérito da FMUSP; e Maria Mathilde Marchi, coordenadora do Núcleo Especializado em Direito (Nudi) do Hospital das Clínicas/FMUSP.

O segundo dia do fórum foi tão marcante e produtivo quanto o primeiro: tomaram parte da mesa-redonda A Terminalidade da Vida em Doenças Agudas, Miguel Kfouri Neto, juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Paraná; Rachel Duarte Moritz, da Comissão de Cuidados Paliativos do CRM de Santa Catarina; Jefferson Piva, médico e editor do Jornal de Pediatria; Jairo Othero, membro da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB-RS); e José Eduardo Siqueira, presidente da SBB. Como debatedores, Renato Terzi, da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB-SP) e Gabriel Oselka, pediatra e professor de Bioética, coordenador do Centro de Bioética do Cremesp.

No período da tarde, abordaram o tema Terminalidade da Vida em Doenças Crônico-Degenerativas o ministro Gilson Langaro Dipp, do Superior Tribunal de Justiça (STJ); Maria Goretti Sales Maciel, do Serviço de Assistência Domiciliar do Hospital do Servidor Público Estadual (HSPE); Cláudia Burlá, da International Association of Gerontology and Geriatrics; e Diaulas Ribeiro, promotor de Defesa dos Usuários de Serviços de Saúde (Pró-Vida), do Distrito Federal. Debatedores: Leonardo Bandarra, chefe do Ministério Público do distrito Federal e Territórios e Maria Júlia Kovacs, do Laboratório de Estudos sobre a Morte da USP (LEM-USP).

Depois das mesas redondas foram abertos os debates ao público, composto fundamentalmente por representantes de entidades médicas e profissionais que atuam no cuidado aos pacientes graves e/ou terminais.

Minuta

Entre outros pontos, a minuta de Resolução elaborada pela Câmara Técnica sobre Terminalidade, do CFM, propõe:

- Que seja permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente, em fase terminal, de enfermidade grave e incurável, respeitada a vontade da pessoa ou de seu representante legal.
- O doente continuará a receber todos os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, assegurada a assistência integral, o conforto psíquico, social e espiritual.
- É vedado ao médico manter os procedimentos que asseguram o funcionamento dos órgãos vitais, quando houver sido diagnosticada a morte encefálica em não doador de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante.

CONSULTA PÚBLICA

Opiniões colhidas no site do Cremesp e do Centro de Bioética, em maio. Os nomes não são identificáveis para manter o sigilo dos participantes

“Tal atitude (limitação de tratamento) visa à saúde, entendida sob o aspecto mais amplo, que inclui saúde psíquica do doente e dos familiares, e de toda a equipe médica”.

“Acho maravilhoso poder optar pelo cancelamento do sofrimento. Tenho câncer de mama e estou em tratamento, mas de forma alguma quero que minha vida seja prorrogada por meio de fios e equipamentos”.

“Chega de tratar quem é terminal apenas como algo que se mantém vivo artificialmente (...),  servindo apenas à necessidade dos parentes e da sociedade de não assumirem a morte como coisa natural e inescapável”.

“Nossa justiça é ré confessa. Matar mãe e pai, ok. Aliviar o sofrimento alheio, dando a chance de um final de vida digno a alguém, pode e vai ser questionado, mas a Resolução em pauta já começa com torcida”.


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