Consulta nº 95.730/19
Assunto: Sobre a realização de exame de corpo de delito fora das dependências do IML.
Relator: Conselheiro Mario Jorge Tsuchiya.
Ementa: É vedada pelo Código de Ética Médica a realização de exames de corpo de delito em delegacias de polícia, unidades militares, casas de detenção e presídios, mas seriam permitidos em dependências como ambulatórios e consultórios adequados à prática de atos médicos, como em aeroportos.
O consulente, Dr. A.M.I.C, encaminha ofício ao CREMESP, no qual discorre sobre possibilidade de realização de exames de corpo de delito fora das dependências do IML, nos seguintes termos:
- Em casos excepcionais, o Instituto Médico Legal do Estado de São Paulo tem sido instado pelas Autoridades Policiais, Judiciárias e Ministério Público, a realizar exames de Corpo de Delito - Lesão Corporal, fora das dependências do IML, na eventualidade de risco à integridade física do periciando, ou para a sociedade, ou em casos em que haja a possibilidade de tumulto e confronto entre grupos politicamente e ideologicamente contrários, facções criminosas, ou mesmo o risco iminente de resgate de presos e líderes de grupos relacionados ao crime organizado "quadrilhas" brasileiros ou estrangeiros. A título de exemplo, cite-se a possibilidade do líder máximo da organização criminosa ou pessoas de notoriedade pública, serem presos em São Paulo, havendo grande divulgação pela imprensa.
Nestes casos, por vezes tem-se requisitado que o exame de Corpo de Delito-Lesão Corporal seja levado a efeito no interior do Ambulatório Médico do Prédio da Polícia Federal; no interior de Ambulatórios Médicos de Aeroportos; em consultórios médicos localizados nos presídios; ou em salas adaptadas, com devida privacidade, no interior de Unidades Prisionais.
Em Face do exposto, questiona-se:
1) Em casos excepcionais, em que haja a possibilidade de exposição a risco do periciando ou da sociedade, no exclusivo interesse da preservação da incolumidade do periciando e da segurança da sociedade, seria eticamente permissível que exames de Corpo de Delito - Lesão Corporal fossem realizados nas dependências de Ambulatório Médico - Consultório Médico - da Policia Federal, ou em Consultórios Médicos de Presídios, onde certamente não haveria constrangimento ao preso ou ao Perito executor do exame?
2) Nestas mesmas eventualidades de exceção, caso não haja no local a ser realizado o exame de Lesão Corporal - Corpo de Delito, ambulatório médico ou consultório médico, seria eticamente permissível, a realização da perícia em ambiente que garanta:
a) Segurança física dos Médicos Legistas e de seus auxiliares;
b) Segurança física dos periciandos;
c) Garantia de autonomia dos periciandos;
d) Garantia de autonomia profissional dos Peritos na elaboração dos respetivos laudos;
e) Adequação do local para realização dos atos periciais, com condição de privacidade entre periciando e Perito.
3) Nos casos em comento, seria necessária a comunicação e autorização prévia do CREMESP, mesmo nas eventualidades de urgência do exame pericial?
4) Haveria impedimento ético em se realizar exames de Corpo de Delito - Lesão Corporal, nas Dependências de consultórios de serviços médicos de aeroportos?
PARECER
O Código de Ética Médica em vigor reza:
Capítulo XI
AUDITORIA E PERÍCIA MÉDICA
É vedado ao médico:
(...)
Art. 95 Realizar exames médico-periciais de corpo de delito em seres humanos no interior de prédios ou de dependências de delegacias de polícia, unidades militares, casas de detenção e presídios.
Desta forma, é cristalina a posição atual do Conselho Federal de Medicina, não se podendo, no momento, realizar exames médico-periciais nas situações acima relacionadas, provavelmente por resquício de um período em que o Brasil viveu em regime de exceção.
Entretanto, creio caber algumas reflexões sobre as situações apontadas pelo Consulente, isto é, o exame pericial, como ato médico sui generis, deve ser realizado em ambiente seguro e digno, permitindo que o perito possa agir de forma isenta, imparcial e autônoma, sem interferências externas.
Atualmente a organização dos Institutos Médicos Legais ganhou autonomia administrativa e financeira, estando estruturada como polícia científica, como Carreira de Estado totalmente independente, assim distanciando-se da antiga organização que vinculava os Institutos dentro da estrutura da Polícia Civil.
Entendemos que se a norma não se coaduna com a realidade fática, é possível e desejável apresentar argumentos para alteração e atualização da norma para adequação aos novos tempos, cabendo realizar esforços junto ao CFM para alteração da atual normativa.
Assim, no momento não seria possível, eticamente, realizar tais exames em delegacias de polícia, unidades militares, casas de detenção e presídios, mas seriam permitidos em dependências como ambulatórios e consultórios adequados à prática de atos médicos, como em aeroportos.
Este é o nosso parecer,
Conselheiro Mario Jorge Tsuchiya
APROVADO NA REUNIÃO DA CÂMARA TÉCNICA DE MEDICINA LEGAL E PERÍCIAS MÉDICAS, REALIZADA EM 25.09.2019
APROVADO NA REUNIÃO DA CÂMARA DE CONSULTAS, REALIZADA EM 08.11.2019
HOMOLOGADO NA 4.921ª REUNIÃO PLENÁRIA, REALIZADA EM 14.11.2019
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